quarta-feira, 25 de julho de 2007

.dia

"Ainda na cama, pensara em areia, mar, beber água do mar na casa da tia morta, em sentir, sobretudo sentir. Esperou alguns segundos sobre a cama e como nada acontecesse viveu um dia comum. Ainda não se libertara do desejo-poder-milagre, desde pequena. A fórmula se realizava tantas vezes: sentir a coisa sem possuí-la. Apenas era preciso que tudo a ajudasse, a deixasse leve e pura, em jejum para receber a imaginação. Difícil como voar e sem apoio para os pés receber nos braços algo extremamente precioso, uma criança, por exemplo. Mesmo só em certo ponto do jogo perdia a sensação de que estava mentindo, - e tinha medo de não estar presente em todos os seus pensamentos. Quis o mar e sentiu os lençóis da cama. O dia prosseguiu e deixou-a atrás, sozinha..."

Trecho de "Perto do coração selvangem", Clarice Lispector


Será que você compreende?

3 comentários:

Thaís disse...

Clarice me acorda no meio das noites, de súbito me vejo rabiscando palavras...
Clarice e minha voz do fundo de mim.
bjo

Cassio Brito disse...

Clarice, clarice... o que fazer com toda essa bruxaria que é tua escrita?
Amiga, amo-te eternamente.
Preciso ter em meu coração algo que eu possa ter consciência da existência. De sua materialidade.
Seu amigo, sempre,

C.

Anônimo disse...

ou como disse caio f.: tens nas mãos a beleza insuportável da coisa inteiramente viva.

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